segunda-feira, 28 de setembro de 2020

Antígona (Antigone, 2019)


Antígona, a resistência está no sangue é um filme lançado em 2019 no seu país de origem, Canadá, e estreia atualmente nas salas virtuais brasileiras. Assim como na tragédia grega produzida por Sófocles, no filme a personagem principal vive um embate entre obedecer as leis impostas pelo Estado ou seguir o que acredita ser certo e guiar-se pelo seu senso de justiça.

Buscando readaptar a obra do autor grego para os dias atuais, a diretora do longa Sophie Deraspe modifica um pouco do enredo, sem tirar o cerne da questão principal da obra. No longa, personagem principal vem de uma família de refugiados que por conta da pobreza e conflitos politicos se estabeleceu no Canadá. Aluna exemplar, Antigona vê sua vida virada para baixo quando uma tragédia atinge seus familiares, no mesmo ato um de seus irmãos é morto pela polícia enquanto o outro é preso. No fim,a personagem tem de escolher qual dos caminhos trilhados pelo filme seguir. Nesse diapasão nenhuma escolha será fácil.


Não se conformando com os rumos que Estado propõe para seus familiares e acreditando que a Justiça não está sendo aplicada, a estudante parte para uma aventura que aos olhos do Estado se configura como uma transgressão da lei.


O filme nos mostra diversas facetas, a questão dos refugiados, a relação da repressão policial, no entanto o que chama atenção é a faceta do confronto entre o jusnaturalismo e o juspositivismo.


Será que uma norma que emana do Estado sempre será justa e aplicada? A Alemanha Nazista estava amparada legalmente quando levava as pessoas para os campos de concentração, mas será que isso pode ser considerado justo?


O que dizer das normas que não “pegam? Pelo código de trânsito é proibido o pedestre caminhar pela rua, essa eu posso falar que já transgredi.


Então existem conceitos que devem ser obedecidos por todos os Estados quando produzem ou aplicam normas?


No plano do Direito Internacional, existem certas normas jus cogens que a depender do grau da transgressão podem até mesmo sofrer sanções penais, podemos citar a busca pela paz e a proibição ao genocídio.


São essas algumas reflexões que o filme traz, não se esgotando nelas.



Autor: Pedro Carvalho

segunda-feira, 21 de setembro de 2020

#Alive


Uma imagem contendo homem, raquete, barco, andando de

Descrição gerada automaticamente           

            Dentro de um contexto pandêmico como o de hoje em dia, a boa sacada do lançamento do filme na plataforma Netflix se encaixou como uma luva. A produção Sul Coreana sobre resistência zumbi é um tanto quanto desconcertante por se assemelhar à realidade dos isolamentos de 2020, causados pela pandemia do COVID19, e por trazer as reflexões impostas pela dificuldade de relacionamentos em tais contextos extremos.

           Apesar de mortos-vivos já terem sido temas de centenas de produções cinematográficas que misturam geralmente horror, suspense, drama, comédia, romance, ação ou ficção científica, os monstros em sua maioria apesar de darem estrutura à trama, figuram apenas como coadjuvantes no desenrolar do enredo. Nesse filme, que apesar de ser uma produção asiática e de pouco orçamento, o enredo foi muito bem planejado e somado ao contexto atual, nos prende a certas similaridades que enfrentamos no presente. 

            Os aficionados por séries como The Walking Dead e Z Nation ou filmes como Guerra Mundial Z e Eu sou a Lenda, talvez sintam falta de efeitos especiais mais exagerados, característica não muito costumaz em filmes asiáticos, mas se alegrarão com o contexto em especial por já entenderem a dinâmica da trama. Por outro lado, o encanto que perceberão e se surpreenderão é com uma dedução lógica de todos aqueles que já viram produções do gênero, a curiosidade, heroísmo e falta de cautela nessas tramas não são as melhores atitudes, mostrando que justamente os mais improváveis são os mais aptos à sobrevivência.

           Ironicamente em um contexto pandêmico, os que eram mais reféns de tecnologias, aficionados por jogos e eletrônicos, pejorativamente chamados em nossa sociedade de “zumbis” por ficarem tanto tempo em frente às telas,  são os que tem mais facilidade e se mostram os mais capacitados para suportar o isolamento que se precede em contraponto àqueles que tinham o contato interpessoal como primordial.

            O filme mostra nuances das implicações dos valores sociais relevantes, ante o momento em que se enseja. Justiça, sanidade, solidariedade são totalmente relativizadas. As necessidades de contato físico, de manter um relacionamento, de confiança interpessoal ficam imensamente abaladas e se enquadram em segundo plano quando a prioridade é o bem maior, a vida. O protagonista deixa isso bem claro quando percebe que não existem mais a barreira do certo e errado, mas somente a do necessário à sobrevivência. Tal contexto deixa o espectador em um misto de angústia e inquietação aguardando sempre os próximos acontecimentos.


Edvaldo da Costa

Membro CineLegis

 


terça-feira, 15 de setembro de 2020

Polêmica? Temos.

 

Filme premiado no Festival de Sundance, mas diretora Maïmouna Doucouré recebeu ameaça de morte. Polêmica? Temos.

O filme franco-senegalês Mignonnes (2020) mal tinha estreado na Netflix e a hashtag pedindo o cancelamento da plataforma de stream já estava nos trending topics (eu inclusive já estava dando like aos posts desse cancelamento sem nem ter assistido 😓). O motivo para tamanha repulsa foi a sexualização de meninas de 11 anos, o possível incentivo à pedofilia, além da descrição do filme falar que a protagonista, vivida pela atriz de 14 anos Fathia Youssouf, explora a própria feminilidade indo de encontro a sua família tradicional, passando uma ideia feminista bem empoderada, mas boa parte do público não enxergou isso no longa-metragem. Após muitos comentários e petições, o cartaz de divulgação da Netflix foi retirado. Mas o lançamento aconteceu repleto de muitas críticas novamente.

Vamos aos fatos: a produção cinematográfica narra a história de Amy, uma criança de 11 anos, que sai do Senegal com sua mãe e irmão mais novo para viverem na França porque seu pai terá uma segunda esposa. Nesse novo ambiente e situação, a protagonista fica muito amiga de Angélica, acabando por entrar no grupo de dança Mignonnes, composto por elas e mais duas meninas, todas da mesma idade.

A partir daí, os comportamentos de Amy mudam drasticamente. A menina que antes participava das tradições da família e era bem dedicada à criação dos irmãos, passa a consumir cada vez mais mídias hiper sexualizadas, com clipes extremamente sensuais, roupas curtas/apertadas, o que influenciam em uma nova Amy, a qual passa a se dedicar obsessivamente pela dança a ponto de se envolver em muitas polêmicas. Muitas mesmo.

Então, é nesse ponto que se concentra o grande impacto desse filme: escancarar sobre as consequências sociais do quão objetificada e vendida é a imagem do corpo, até mesmo de crianças, mas muitas vezes é normatizada ou tida como tradição. A tia de Amy estava noiva quando tinha 11 anos. Ademais, o filme tenta abordar a passagem complexa da vida infantil para a adolescência, bem como a falta de conhecimento presente nesse momento.

Não há dúvidas de que esse filme é extremamente pesado (tive pesadelos depois de assisti-lo); embora tenha cenas pontuais bem poéticas – como o imponente vestido menstruando ou o abraço da mãe e filha com roupas tão brilhosas e arrumadas em completa oposição de uma com a outra – a maioria delas causam uma revolta, aflição terrível, por isso a classificação indicativa de 16 anos, logo, as atrizes não podem assistir, e isso foi mais um frisson. Mas, claramente, não é para crianças assistirem, o filme é impulsionador para uma discussão adulta muito pertinente na sociedade capitalista, machista e exploradora da atualidade.

OBS: Isso não é necessariamente uma recomendação. É um desabafo.

Caso assista, é válido ver a entrevista da diretora também, disponível no link:  https://www.youtube.com/watch?v=UnpuqptL8eg

Matéria recomendada: https://www.omelete.com.br/netflix/por-que-cuties-da-netflix-incomoda-tanto

Por Caroline Bento,

Membra Cinelegis.