segunda-feira, 10 de setembro de 2018

Ladrões de Bicicleta

Ladrões de Bicicleta é um dos filmes mais importantes do neorrealismo italiano, movimento este que se dedicava a retratar as consequências e dificuldades enfrentadas pela população que sobreviveu a segunda guerra mundial.  
As obras possuíam características diferenciadas das demais, como: baixo orçamento, filmagens realizadas ao ar livre, uso de atores amadores, uso da língua falada com diálogos simples, além d o uso da arte para denunciar a miséria prevalente à época.  Muitas foram as críticas por causa da imagem da Itália retratada através das lentes, levando os diretores a largarem o movimento anos depois.
Vittorio de Sica foi o responsável pela direção desta magnifica obra, e sabia como ninguém demonstrar o principal tema do movimento: o desespero humano pela sobrevivência. E é ele que nos convida a acompanhar a saga de uma família italiana da década de 40 que busca a sobrevivência, de forma grave e sentimental.
Todo o enredo se desenvolve em torno da história de um pai, Antonio Ricci, que busca um emprego e, assim como outros milhares de italianos, depois de muita espera, acaba sendo chamado para um posto de colador de cartazes, porém é informado que para este, ele deve possuir uma bicicleta. Ao retornar para sua casa, ao encontrar-se com sua esposa, Maria, estes decidem por vender alguns de seus pertences para conseguirem o dinheiro necessário para aquisição da bicicleta.

O primeiro dia de trabalho é o ponto marcante do filme, primeiramente, pela alegria expressada por um pai de família esperançoso, imaginado dias melhores. No entanto logo em seguida a desilusão o toma devido o seguinte.
Como forma de evitar spoilers, e como estudante de Direito, surge então o problema de analisar através do filme a necessidade de conceituar o papel que o Estado deve desempenhar como forma de superar os impasses do convívio social, em razão da complexidade das relações humanas modernas. Assim temos constatada uma crise na sociedade moderna que impôs ao Estado dificuldades ao seu exercício de um regime democrático legítimo.

Devemos perceber que uma característica comum às sociedades democráticas é o princípio nuclear do exercício da liberdade e a garantia da igualdade. Já o princípio constitucional da solidariedade soma-se a esses princípios no momento em que nos faz afastar da interpretação dos institutos do Estado de Direito como política individualista, que subordina a dimensão pública e o interesse geral ao primado absoluto dos valores e expectativas individuais.
Portanto, o Direito deve ser produto da vontade de agentes livres e iguais, vez que o Direito democrático considera todos os sujeitos como autores e destinatários de normas e instituições. Por isso, devemos ir além da noção de cidadania como mero status legal, para encará-la como cidadania moral que se materializa nas condições de participação do indivíduo na sociedade.

Anderson de Almeida
Acadêmico de Direito/UFRN

segunda-feira, 3 de setembro de 2018

Resenha: O abutre

O filme conta a história de Louis Bloom (Jake Gyllenhaal), um ladrão de metais que tenta ganhar a vida de um jeito fácil. Bloom até tenta arranjar um emprego decente, que possa construir sua carreira, mas seu status de ladrão acaba descredibilizando-o. Em seu caminho de volta para casa, Bloom tem sua atenção tomada por um acidente na avenida, na qual fica parado observando o acontecimento até se deparar com um cinegrafista freelancer, que filma todo o ocorrido e vítimas para vender para alguma emissora de TV.
Bloom se interessa por isso, acredita que é dinheiro fácil e compra uma câmera e um rádio de polícia no qual fica escutando o dia inteiro em busca de acidentes para fazer imagens e negociar com as emissoras. Seus vídeos começam a ter notoriedade pela mídia. Bloom entende que é um trabalho promissor e contrata um funcionário para ajudar no trabalho.

Os dias seguem até que ele encontra a catástrofe perfeita, um acidente no qual ele chega antes da polícia. Bloom entra em cena dando sentido à palavra “abutre“. Movido pelo dinheiro e pela falta de sentimentalismo ele começa a moldar a cena do crime, alterando o que pode no cenário a fim de que tudo se enquadre melhor em suas lentes. Esta é a grande chance do personagem obter algum êxito: alterar as cenas dos crimes lhe rendem muito mais dinheiro. Bloom começa a esquematizar seu próximo e último acidente do filme, o acidente que custa a vida de alguns figurantes, policiais e seu funcionário, o acidente que lhe rende dinheiro para a fundação da Video Production Services, sua empresa de imagens.

O filme traz à discussão não só os limites de onde termina o direito de um e começa o direito do outro, mas também fala sobre algo fundamental para uma sociedade, empatia. Empatia não só quando se deixa de importar com o próximo, mas com até o cometimento de crimes para ganhar uma “vantagem” utilizando outro ser humano como um verdadeiro objeto para o seu bem próprio, ignorando completamente os princípios fundamentais do Estado Democrático de Direito, onde no Brasil prevê que a conduta da personagem já desde o início seria criminosa como declara o art. 135 do Código Penal/1940 na qual trata do crime de omissão de socorro onde é previsto pena de detenção de um a seis meses ou multa; na constituição sem dúvidas que após a ditadura militar um princípio muito buscado para o aperfeiçoamento do Estado Democrático é o da Dignidade da Pessoa Humana  com o claro objetivo de proteger o direito de todos em todas as situações.


Ana Beatriz Brito
Membro CineLegis - 2018


quinta-feira, 9 de agosto de 2018

Eu não sou um homem fácil: uma criativa crítica ao machismo

“Eu não sou um homem fácil” é um filme francês, lançado recentemente e embora o título pareça ser, a princípio, de uma comédia machista travestida de feminista, rapidamente revela-se o verdadeiro objetivo da trama que é justamente o oposto. Com uma proposta extremamente interessante, mostra o machismo sob o prisma de uma sociedade em que os papéis são invertidos e as mulheres representam o sexo majoritário detentor de todo o poder.
Nesse cenário, é contada a história de Damien (Vincent Elbaz), sujeito representante oficial do típico estereótipo machista, “conquistador”, o qual desrespeita e reifica mulheres e as trata como objetos que tem por obrigação a satisfação dos seus prazeres libidinosos. Assim, acontece uma reviravolta quando a vida escolhe dar uma lição em Damien de um modo não tão gentil: em um dos seus momentos de assediar garotas ele se distrai, bate a cabeça em um poste e desmaia. A partir de então, acorda em um mundo totalmente diferente do que estava acostumado, e ainda que permaneça com os mesmos amigos e com o mesmo emprego, todos ao seu redor estão adaptados ao “novo mundo”.

Ao longo do filme são mostradas diversas situações em que há forte inversão de papéis e enquanto os homens ficam responsáveis pelas tarefas domésticas, as mulheres passam a ocupar os mais importantes cargos profissionais. A começar pela paramédica que o atendeu após o seu tombo, além dela, as garis na rua eram todas mulheres, o seu melhor amigo tornou-se dono de casa, a sua chefe passou a usar terno para trabalhar, a sua mãe passou a tomar conta do açougue
enquanto seu pai ficou trabalhando no caixa e comumente passou a ouvir “fiu-fiu” de mulheres.

Além disso, o corpo masculino passou a ser tratado de modo exageradamente sexual e uma prática muito comum passou a ser homens se depilando para adequar-se ao padrão imposto, uma vez que ter pelos representaria uma prática asquerosa e nojenta.  Nesse mundo invertido, em que o “sexo frágil” é o dos homens, os quais estão sempre cautelosos em suas atitudes para não serem julgados como “fora do padrão”, as mulheres arrotam, traem, assistem futebol, não são românticas e são extremamente respeitadas, correm nas ruas sem camisa e sem preocupação em sofrer assédio. Uma das mulheres, inclusive, Alissandra, a qual havia sido cantada por Damien no começo do longa, tornou-se bem parecida com a pessoa que ele menos esperava: ele mesmo antes do desmaio! Ela objetifica os homens, trata-os como meros pedaços de carne 
com intuito de obter prazer, e assim, o protagonista começa a sentir na própria pele as 
consequências dos seus atos repugnantes.

Damien ao longo do filme se adequa ao “masculinismo”, que no “mundo real” corresponde ao 
movimento feminista. É importante ressaltar que o termo utilizado não é
 “machismo”, evidenciando, assim, que o feminismo não é o 
oposto do machismo.
Ademais, há uma passagem bastante forte no filme, quando Damien é levado à boate gay, um ambiente exclusivo e frequentado por homossexuais que se vestem da forma que a “normalidade” do protagonista exige. Ou seja, as pessoas vistas como fora dos padrões são marginalizadas, e precisam de um local mais reservado aos olhos do público para se divertirem e mostrarem quem são de verdade e em qualquer mundo que seja, a sociedade sempre marginalizará o diferente.

Desse modo, a riqueza do filme consiste em proporcionar inúmeras reflexões, principalmente naqueles ou naquelas que acham que o machismo não existe. De um modo sutil e descontraído é retratada a difícil realidade em ser mulher na sociedade
 em que vivemos, e, ainda mais, do quão perigoso é padronizar o que quer que seja, tendo em vista que rótulos foram feitos para coisas e não para pessoas. Em uma sociedade enraizadamente patriarcal, inúmeras situações são vistas como naturais quando as pessoas constrangidas são mulheres, e quando são os homens a impressão majoritária é de choque, mas por quê? Justamente pela falta de costume acerca da igualdade entre os gêneros e pela naturalização do machismo. Por isso, o filme se torna extremamente educativo e necessário de ser visto.

Por fim, o pensamento elaborado pelo exímio Paulo Freire, “a tranquilidade dos opressores, é baseada em quão bem as pessoas se adaptam às do mundo que eles criaram, e quão pouco eles o questionam”, encaixa-se e resume perfeitamente à temática do filme, uma vez que é mostrada uma sociedade matriarcal de modo a criticar intrisecamente à sociedade patriarcal em que vivemos, concluindo, assim, que extremismo e intolerância geram 
consequências inenarráveis e necessitam urgentemente de desconstrução.
O filme encontra-se disponível na Netflix.

Olivia Medeiros
Participante do Cinelegis em 2018 

Amor e Fantasia e os Horrores da Segunda Guerra Mundial


A VIDA É BELA (La vita è bella)
Comédia dramática
Ano: 1997
Direção: Roberto Benigni
Duração: 116min
Itália

Este filme foi ambientado no contexto da Segunda Guerra Mundial e trata da história de um homem que usou a imaginação e seu incansável espírito para salvar aqueles a quem amava.
Tendo como personagem principal Guido, um homem extremamente criativo e simples que através da sua espontaneidade e carisma conquista o apreço dos que estão a sua volta. Ele, garçom, apaixona-se por uma professora de cuja relação nasce um menino chamado José.
No decorrer do filme o clima de harmonia da família é interrompido quando eles são levados a um campo de concentração, ficando pai e filho juntos. Usando de sua criatividade Guido faz com que seu filho acredite que eles estavam em um jogo e que deveriam seguir determinadas regras para conseguir pontos e que ao final quem ganhasse levaria para casa um tanque de guerra de verdade.
Um filme extremamente emocionante e que nos leva a reflexão do contraste da pureza da alma com os horrores trazidos pela guerra, principalmente para as crianças e os mais jovens.

Robson Eduardo Martins
Membro do Cinelegis em 2018

terça-feira, 19 de junho de 2018

PERSÉPOLIS

     Uma das propostas do projeto Cine Legis é aliar o direito ao cinema, buscando na linguagem cinematográfica um instrumento motivador de debates socialmente relevantes, de modo a estimular nos estudantes o desenvolvimento do raciocínio crítico e da reflexão. Assim, foi realizada na última quinta-feira (14/06) uma atuação em uma escola estadual do Ensino Médio, a fim de trabalhar o conteúdo trabalhado em sala de aula. 

O filme escolhido para ser trabalhado foi Persepolis, baseado em uma história real de uma mulher iraniana chamada Marjane Satrapi. Ele narra e desenha em preto e branco sua vida e a trajetória de seu país ao longo dos quase quinze anos em que a narrativa se passa. Nesse ínterim, guerras, lutas, exílio, intolerância, revolução, ditadura e resistência perpassam a narrativa entrecruzando as histórias do país às suas experiências pessoais. 

No período que vai de 1950 a 1970, o Irã representava uma das maiores monarquias conservadoras apoiadas pelos EUA, no contexto da Guerra Fria. No entanto, a relação começou a ser desfeita no final dos anos 70, com o início da Revolução Iraniana. O capítulo inaugural do filme é nesse período de 1980, com o apoio de maioria da população, provocando a queda da monarquia. O novo governo passou a criticar o Ocidente, em especial os EUA. 
Nesse novo sistema, o uso do véu passou a ser obrigatório nas escolas, embora as meninas não compreendessem o significado dele. Músicas, filmes e produtos ocidentais eram estritamente proibidos, assim como qualquer bebida alcoólica. Nesse mesmo período, o Irã começou a tentar intervir nos assuntos internos de outros países, por exemplo do Iraque. Isso gerou insatisfação no governo iraquiano, fazendo com que Saddam Hussein declarasse guerra contra o Irã no final de 1980. 

Em 1984 essa guerra é intensificada e são poucas as possibilidades de se cruzar as fronteiras. No entanto os pais de Marjane encontram uma chance de enviar a menina para o exterior, mandando-a para Viena. Ela passa a enfrentar a solidão, a dificuldade do contato com outras línguas, outras culturas e a saudade do lar. Além disso, a guerra vai interferir na imagem que o povo iraniano demonstra frente as outras nações e isso vai ser exposto da sua permanência no país.

Depois de cerca de 4 anos longe de casa, ele decide retornar para casa. No entanto, ao ser atualizada da situação do seu país, o qual estava devastado pelos anos de guerra, bombardeios e o consequente saldo de mortos, Marjane é arrastada para um período de forte depressão, proveniente da dificuldade em se restabelecer iraniana. Após um casamento frustrado, no auge de seus vinte anos, ela decide sair de vez do Irã e tenta traçar novos caminhos na França, cena que encerra o filme, em 1992. 

Ao término do filme, os alunos compartilharam seus entendimentos sobre o filme, sob a perspectiva da liberdade de expressão. Foi percebido que esse direito foi bastante infringido ao longo do filme, quando ele na verdade deveria ter sido assegurado e garantido aos iranianos. Além disso, foi percebido como o totalitarismo e a intolerância, mais especificamente a política, atrapalham o convívio harmônico da sociedade. 

Com o filme, percebemos que Marjane começou como uma pequena garota que presenciou situações controversas em seu país, que enfrentou o desconhecido e a solidão, que se perdeu e reencontrou. No entanto, ela encarou todas essas dificuldades, todos os preconceitos, sem nunca aceitar o que lhe era imposto e acabou amadurecendo. 
Marina Olívia
Direito - UFRN
Membro do Cine Legis (Gestão 2018)

terça-feira, 5 de junho de 2018

Universidade dos juristas mortos: repensando a Educação Jurídica


Na manhã de ontem (04/06), o Centro Acadêmico Amaro Cavalcanti promoveu uma Assembleia Estudantil em que foi apresentada aos discentes do curso a nova matriz curricular, além de dados referentes à última pesquisa realizada pelo COMPAD (Comissão Permanente de Acompanhamento Docente). Na esteira do evento, em especial das falas da professora Karol Marinho e do professor Ângelo Menezes, proponho uma reflexão acerca da Educação Jurídica, tomando como ponto de partida o clássico filme Sociedade dos Poetas Mortos (1989), dirigido por Peter Weir.

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Na película, o espectador acompanha a chegada do professor de literatura John Keating a um internato de meninos extremamente conservador e tradicional, no qual os alunos vivem em uma constante pressão quanto ao rendimento acadêmico e às escolhas profissionais. Keating, com sua didática inovadora e dissonante dos academicismos arraigados na escola, conquista os estudantes, que, antes descontentes com a sala de aula, motivam-se na vida estudantil e descobrem a si próprios em um processo de crescimento que envolve desde questões do cotidiano adolescente até dilemas mais sérios, como a decisão da carreira a ser seguida posteriormente.
Em um claro exemplo do que seria uma educação libertadora, o professor Keating fez com que a experiência escolar intervisse de alguma maneira no universo particular dos alunos, libertando-os, a partir da poesia, de um automatismo que os condenava a uma vida medíocre. Ao dá-los a autonomia e a liberdade na educação, Keating os torna seres donos da própria vida, prontos para construírem seus caminhos.

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O enredo do filme, embora situado no contexto da educação básica, pode colaborar para uma discussão sobre a Educação Jurídica no ensino superior. Tendo-o em mente, é válido se questionar: será que, em nosso ambiente universitário, há um processo educacional que ressoe a experiência ocorrida entre o professor Keating e seus alunos? Inegavelmente, não.
Indo totalmente na linha contrária da educação libertadora, temos um ensino desestimulador que parece alheio à realidade existente além dos muros da universidade. Em meio a professores que funcionam no modo automático, com uma didática retrógrada e imutável – muitas vezes abusiva, fulcrada em um terror psicológico -, os alunos se desmotivam e não veem mais a educação como um instrumento de intervenção social, um dispositivo de mudança, uma vez que eles mesmos não se sentem tocados por ela. 
Leis, doutrinas, jurisprudências se tornam apenas o conteúdo da prova objetiva da semana que vem e o estudante perde a noção da importância que tudo aquilo possui na realidade prática, assumindo uma postura de indiferença perante aquilo que “aprende”. Assim, a vida universitária torna-se insignificante, resumida a chamadas e notas na média, num teatro em que os professores fingem dar aula e os alunos fingem aprender. 
Há, obviamente, exceções nesse quadro. Entretanto, elas precisam ser a regra. A universidade deve ser um espaço vivo, de ciência, partilha, aproximação e crescimento. Só assim ela formará juristas de qualidade, preparados para, de alguma maneira, intervir na sociedade. É difícil apontar qual é o melhor caminho para se alcançar essa Educação Jurídica ideal, mas é certo que, sozinha, a mudança na matriz curricular não trará os resultados esperados, pois as questões que assolam o curso no momento vão bem além disso e estão associadas a uma cultura do medíocre enraizada em quase todos que o compõem – docentes, discentes, coordenadores etc.
Por fim, pensar um novo modo de educar é sempre um caminho pedregoso, repleto de represálias. É, antes de tudo, opor-se a um modelo tradicional que é cômodo, porém problemático. Portanto, em meio a obstáculos que venham a aparecer nesse percurso, é primordial sempre lembrar o conselho do professor Keating: não podemos aceitar o medíocre. Lutemos, pois, por uma vida universitária extraordinária. Carpe diem.


Lucas José de Mello Lopes
             Direito - UFRN
Membro do CineLegis (Gestão 2018)

segunda-feira, 28 de maio de 2018

Que Bom te Ver Viva (Documentário) - Mulheres que sobreviveram à ditadura militar

      O documentário nacional “Que Bom te Ver Viva”, dirigido pela diretora Lúcia Murat, traz relatos de mulheres que foram torturadas durante a ditadura militar no Brasil.

    No filme, essas mulheres contam como sobreviveram a tanta violência na época e como estão sobrevivendo atualmente depois de passarem por uma experiência tão traumática. Nesse sentido, são apresentadas as consequências que essas mulheres sofreram em suas vidas e como ser uma ex-presa política impactou e ainda impacta sua vida como mãe, como filha e, sobretudo, como mulher. Aborda também como a sexualidade dessas mulheres foi afetada e a tortura em seu aspecto físico, psíquico e sexual.

     Ao mesmo tempo em que esses depoimentos são apresentados, a atriz Irene Ravache, em uma performance brilhante, interpreta uma personagem anônima, também vítima de tortura. “Essa é a minha história e vocês vão ter que me suportar!”, grita a atriz/personagem em um dos momentos iniciais do filme


    Para deixar claro essa dicotomia entre documentário/ficção a realidade e a interpretação da atriz Irene, a diretora Lúcia Murat, que também foi vítima de tortura pela ditadura militar, utiliza alguns artifícios fílmicos: utilizando luz natural e um enquadramento específico para gravar os depoimentos das vítimas e utilizando luz teatral para gravar as cenas de Irene.

     O filme se encontra disponível no Youtube.

Lucas Alencar
5º Período/Direito – UFRN
Membro do CineLegis desde 2017

segunda-feira, 21 de maio de 2018

Os Intocáveis e o olhar sobre o diferente


           Os Intocáveis (Intouchables) é um filme lançado em 2011, baseado em fatos reais e recordista de bilheteria em diversos países ao redor do mundo, tornando-se o filme francês mais rentável da história. O tamanho sucesso do filme é merecido. O enredo aborda de maneira agradável e bem-humorada a sensível história de Philippe (François Cluzet), um aristocrata milionário que fica tetraplégico após um grave acidente. Em razão de sua deficiência, Philippe vê a necessidade de um cuidador para ajudá-lo em todas as suas atividades diárias. Nesse contexto, começa a entrevistar candidatos para o cargo juntamente com a sua assistente Magalie (Audrey Fleurot) e, apesar de se deparar com os mais qualificados profissionais, não confia o emprego a nenhum deles
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         Neste cenário, Driss (Omar Sy), um ex-presidiário residente  dos subúrbios de Paris, sem qualquer experiência para o cargo, comparece à entrevista apenas pela necessidade de comprovar sua presença para garantir seu seguro-desemprego, fornecido pelo direito francês. Sem intuito de conseguir a ocupação, o senegalês Driss, em decorrência de seu jeito peculiar, chama a atenção de Philippe, que decide lhe conceder a chance de trabalho.

            A partir daí, Driss, a despeito de sua inexperiência e de sua inicial falta de interesse, passa a cuidar de Philippe de uma maneira não convencional e, eventualmente, acaba por se tornar o melhor cuidador que o milionário já teve. Os dois superam suas distintas realidades e viram grandes amigos, de modo que vencem suas respectivas dificuldades e passam a encarar novas experiências juntos.

            Desse modo, a parceria aparentemente improvável entre um ex-detento morador da periferia e um deficiente físico aristocrata demonstra como o convívio com o diferente é capaz de abrir nossas mentes e mudar nossa visão de mundo. É nesse sentido que Driss – expulso de casa e excluído pela sociedade – decide arriscar algo que jamais experimentou e acaba por conseguir um notável crescimento pessoal. Philippe, por sua vez, abandona a zona de conforto e aprende a viver intensamente, mesmo após sua tragédia.

            O comprometimento com o bem estar do próximo, bem como a superação de preconceitos e a abertura para novas experiências, são os ensinamentos aspirados pelo filme francês, o qual retrata um tema delicado de modo descontraído e emocionante.



Kívia Florêncio

4º período/ Direito - UFRN

Membro do CineLegis em 2018

sexta-feira, 18 de maio de 2018

Aniquilação e a autodestrutiva condição humana


Aniquilação (no original: Annihilation) é antes de tudo uma clássica ficção científica, que se de uma narrativa baseada em conceitos científicos para tratar de forma alegórica sobre um tema muito mais profundo.
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Na trama do filme um meteorito atinge um farol no  sul da Flórida, uma espécie de “bolha” se forma sobre a  região, passando a expandir-se. Chamada de “O Brilho” e  delimitando a misteriosa “Área X”, esta barreira se revela  uma passagem de mão única, já que ninguém que a  atravessa consegue retornar – com exceção do sargento  Kane (Oscar Isaac), que, depois de um ano desaparecido,  surge subitamente diante da esposa Lena (Natalie  Portman). Fisicamente afetado pela experiência, ele entra  em coma, levando Lena a se oferecer para acompanhar a  expedição seguinte à Área X a fim de tentar encontrar  alguma forma de curá-lo. Nessa nova expedição Lena ainda  é acompanhada pela à psicóloga Dra. Ventress, à  paramédica Anya Thorensen, à física Josie Radek e a  geomorfológa Cass Sheppard.

Contudo, para além do que se transmite expressamente em tela, podemos perceber que os temas centrais do filme dizem respeito à depressão, o suicídio e nossa tendência à autodestruição através de gestos e decisões que reconhecemos como potencialmente devastadores. Em outras palavras, é possível perceber que todo o enredo se desenrola por meio da temática do sofrimento humano.


Exemplo disso podemos retirar dos diálogos das personagens. “Todas temos problemas”, diz a geomorfóloga ao analisar por que se ofereceu, ao lado de quatro outras mulheres, para uma missão considerada suicida. Em outra situação, Quando Lena questiona a Ventress sobre o motivo para seu marido participar de uma ‘missão suicida’, a psicóloga rebate: “Quase ninguém comete suicídio, mas quase todos nos autodestruímos. De alguma maneira, em alguma parte de nossas vidas, nós bebemos, usamos drogas, desestabilizamos um emprego bom ou mesmo um casamento feliz”.
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Adotando o ouroboros como um  símbolo  temático da narrativa (sugerindo uma  ideia de ciclo que lava a própria aniquilação), o  filme busca discutir a tendência de muitos à  autodestruição ao criar paralelos entre estas  ações e as células que, multiplicando-se  descontroladamente, transformam a criação de  vida em um caminho para a morte através do  câncer. Ao mesmo tempo, a depressão surge  como motivador importante na decisão das  personagens de se oferecerem para uma missão suicida, tampouco sendo coincidência o fato de Lena dizer para um desacordado Kane que sabe por que este entrou na Área X (algo que descobriremos ao longo da narrativa).

Amarrando todos estes temas ao abordar as transformações pelas quais as personagens passam em função de incidentes traumáticos, do câncer, do alcoolismo e da depressão, o filme parece tentar nos convencer que a autodestruição faz parte do exercício do direito a liberdade e autodeterminação, e que estaríamos todos, em maior ou menor grau, buscando uma forma de nos autodestruirmos. 



Juan Lucas, 3° Período

Direito – UFRN

Membro do Cine Legis desde 2017

domingo, 13 de maio de 2018

Até o ùltimo homem: o embate entre guerra e paz


         Filme que tem como base uma história real, conta a trajetória de um corajoso soldado do interior dos Estados Unidos, chamado Desmond Doss (interpretado pelo ator Andrew Garfield), o qual promove ao longo de sua vivência inúmeras lições de vida escassas na atualidade.
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            Desmond é um indivíduo que acredita de maneira inimaginável em seus princípios transmitidos pela sua fé e pelo próprio aprendizado que adquiriu por determinadas situações em seu cotidiano. 
            Ao resolver alistar-se no exército americano, o jovem demonstra intensas divergência dos demais. Desmond Doss, baseado em seus princípios, compromete-se com si mesmo a não fazer uso de nenhuma arma de fogo, mesmo que necessário durante a guerra. Ao longo da trama pode-se notar que este fato causará diversos problemas e dificuldades a Doss, em especial por parte de seus colegas de exército e seus superiores, sendo castigado por tal atitude. 
            Apesar de seu voto “de paz”, o soldado é mandado a um dos campos de batalha mais sangrentos e terríveis na história da humanidade. A sua decisão de não utilizar armas de fogo foi responsável pelo salvamento de inúmeros outros companheiros durante esta guerra, na qual atuou como médico, salvando diversas vidas e levando ao seu reconhecimento. 
            A produção inicialmente mostra-se um clichê, causando um impacto surpreendente durante o decorrer do filme, ao demonstrar que nada do que se imagina inicialmente definirá a qualidade do filme. A cada momento e de formas diferentes, uma lição de amor e paz num mundo tão necessitado de tais elementos é passada ao público. 
            Portanto, as atitudes do médico servem de reflexão à atual sociedade massacrante, que esconde-se por trás de um véu de frieza e indiferença. Instigam a análise da importância do amor e paz como remédios para o mal desencadeado a cada dia, desde pequenas atitudes àquelas que impactam toda a humanidade.


Fernanda Jácome, 4° Período
Direito – UFRN
Membro do Cinelegis em 2017

segunda-feira, 30 de abril de 2018

Resenha: Distrito 9 e a xenofobia


            A história começa com uma nave alienígena parando sobre a cidade de Johanesburgo, que é a maior cidade da África do Sul (país onde o diretor Neill Blomkamp nasceu), e lá fica presa por uma falta de combustível. Logo uma missão humanitária leva ajuda aos Alienígenas, que estão sem recursos para sobreviver, e os mesmos são colocados abaixo da nave e formam ali um distrito provisório que leva o nome do filme (District 9).
Pôster do filme Distrito 9, mostrando a nave e a favela
É importante notar que o filme todo se passa na África do Sul e que, neste caso, diferente da maioria dos filmes Hollywoodianos, os aliens estão à mercê da humanidade e precisam de ajuda. O problema é que os aliens acabam sendo marginalizados e o distrito acaba se transformando em uma enorme favela e a expansão dessa favela começa a chegar nas cidades próximas, vista toda a marginalização causada pelo governo a essa população alien, seguida do repúdio que os próprios humanos criam daquela comunidade decantada e vivendo de restos, o governo vê que é necessário transportar e expulsar todos daquela área mesmo depois de anos construindo ali suas vidas, isso com apoio e alvará tanto da população quanto da mídia. A partir disso, começa o desenrolar de uma trama que é uma clara alusão ao Apartheid, e o distrito uma grande representação de Soweto (cidade que nasceu e cresceu a partir de uma população imigrante de trabalhadores negros que eram proibidos de ocuparem as cidades “brancas” do país no regime Apartheid).


Distrito de Soweto
        Distrito 9 (filme)




            O protagonista do filme é Wikus Van De Merwe, um funcionário do governo que anda emitindo ordens de despejo para os aliens. Ele é a síntese de todos os preconceitos que a população humana tem com os aliens, chama-os de “camarões”, maneira pejorativa de inferiorizar a raça pelas diferenças e também de desumanizar, para assim o processo de apatia ser mais fácil. Isso aconteceu em vários casos da história do mundo, como com os índios brasileiros, que eram vistos como sem alma pela igreja, facilitando a escravização, ou os negros africanos, que eram vistos como uma raça inferior por vários estudiosos europeus no fim do século XIX. 

Alien que defende a propriedade contra o protagonista Wikus
                Em meio ao conflito no qual o alien se nega ao despejo, o personagem Wikus acaba sendo infectado e passa por um processo de mutação no qual seu corpo começa a se transformar em um alien. Nesse momento, ele percebe que todas as ações preconceituosas e xenofóbicas  se voltam contra ele, para aí ele perceber todo o preconceito que aquela raça sofria simplesmente por ser diferente. A partir daí, passa a ser caçado pelo governo que defendia e é negado até pela própria esposa. Todos os meios que ele viveu e socializou, portanto, o renegam, chegando ao ponto em que ele se une aos aliens numa investida de tentar escapar do planeta e achar uma cura.
               A grande jogada do filme está em trazer um protagonista totalmente detestável e desprezível da perspectiva do telespectador, que é consciente da alegoria que é o filme, porém com a mudança jogada e o personagem mudando de posição, nós percebemos que tudo aquilo que ele fazia não era por ser alguém ruim, mas sim porque aquele preconceito tinha sido inserido em sua cabeça de diversas formas. O governo e a mídia sempre destratavam os aliens, ou por declararem que os mesmos consumiam muito recursos, ou por colocarem os aliens em meio ao lixo, ou mesmo os tratando como perigosos, sendo que no fim o governo acaba sendo o verdadeiro inimigo por não ter implantado verdadeiras políticas de inclusão.

Take final do filme, o protagonista Wikus mostrando o que é viver à margem da sociedade, ser visto como um animal mesmo com um olhar tão vivo e humano
Felipe Silva Motta
Ciências Sociais - 3º Período
Membro do Cine Legis 2018